DISCURSO DO GOVERNADOR LEONEL BRIZOLA POR OCASIÃO DA INSTALAÇÃO DO CODESUL E DO BRDE

22 de dezembro de 1961.

Degravação do Movimento Autenticidade Trabalhista

Ipsis literis

 

 

Excelentíssimo Senhor Presidente da República

Excelentíssimos Senhores Governadores Celso Ramos e Ney Braga

Digníssimas Autoridades

Minhas Senhoras e meus Senhores

 

 

            Fiel à sua tradição de guarda avançada da unidade nacional, o Rio Grande do Sul desfraldou a bandeira da luta contra as disparidades regionais, movido não apenas pelos interesses de defesa de sua economia. Fomos impulsionados pela consciência de que o Brasil não poderá continuar sendo um país economicamente desarticulado.

           

A vivência angustiada dos problemas administrativos do nosso Estado levou-se à contemplação da realidade econômica de todo o Brasil, e dela recolhi a convicção de que o processo de empobrecimento gaúcho não era mais que a repartição do processo que criou as áreas subdesenvolvidas do Nordeste e as demais regiões brasileiras marginalizadas. Não importa que o grau de estagnação atingido hoje pela economia sulriograndense não seja o mesmo que imobiliza e deprime a economia nordestina. De fundamental importância é reconhecer a identidade do processo. Ao reconhecê-lo, nós o isentamos de uma feição subalterna, para alçá-lo à condição de diagnóstico e uma parte essencial, da crise brasileira. Com isto conseqüentemente proclamamos que a solução dos nossos problemas não será corretamente alcançada enquanto todo o resto do Brasil não atingir o mesmo grau de desenvolvimento que aspiramos para o nosso Estado e a nossa região.         

Não irei aqui renovar as afirmações sobre as causas e origens do processo de descapitalização que nos afeta. O País já adquiriu consciência de que ou teremos um desenvolvimento contínuo, homogêneo e geograficamente bem distribuído, ou não conseguiremos atingir a condição de nação organicamente estruturada.      

A convivência de regiões atrasadas com regiões adiantadas dentro de uma mesma pátria não importa apenas num espetáculo injurioso aos sentimentos de justiça e fraternidade próprios de uma comunhão nacional.     

Os próprios interesses materiais do País são rudemente afetados por esse desequilíbrio e esse descompasso dos nossos níveis internos de desenvolvimento. A conseqüência desse desequilíbrio é o surgimento de uma espécie de colonismo intramuros, tanto mais absurdo quando contemporâneo de uma época histórica que se caracteriza por ser precisamente a da extinção do colonismo internacional.      

Todos os esforços empregados hoje pela humanidade visam fundamentalmente senão a eliminação, pelo menos a crescente redução das desigualdades econômicas entre as classes que compõem as sociedades nacionais. Pelos mesmos motivos com que perseguimos esses ideais de justiça social e de equidade econômica entre as classes, devemos também lutar para que entre os Estados de uma federação desapareçam aquelas desigualdades que desejamos sejam eliminadas da convivência entre as categorias sociais.          

A elevação de todas as regiões de um país ao mesmo nível de progresso econômico, tecnológico e social é condição básica para que, nesse país, a circulação, a distribuição de riqueza nacional e a sua própria criação se façam em termos que impliquem na elevação dos padrões de vida de todas as populações que compõem a nacionalidade.         

É também uma exigência de ampliação do nosso mercado interno, sem o qual a própria economia das áreas que seriam mais avançadas estaria seriamente comprometida. A desigualdade dos níveis de desenvolvimento regional é um fator limitante da própria expansão do País.         

Com a clara compreensão deste fato, amparados na generosidade e solidariedade dos Governadores Celso Ramos, de Santa Catarina, e Ney Braga, do Paraná, levantamos à consideração do Governo Federal, na Conferência de Florianópolis a idéia da criação, para o Brasil Meridional, de órgãos de planejamento e de execução de uma política regional de desenvolvimento econômico. Prontamente o então presidente Jânio Quadros acolheu com o maior entusiasmo a sugestão, e por tal forma ela se tornou sensível que em tudo facilitou o seu andamento. Mencionar essa acolhida do ex Presidente é um ato que fazemos por uma questão de irrestrita justiça e a qual não poderíamos fugir, quando vemos agora nossas aspirações convertidas em realidade e consagrada pelo seu sucessor.          

Assim o fizemos, primeiro por considerarmos que a solução de nossos problemas não seria correta nem permanente se o Brasil continuasse sendo uma Federação de economias regionais desarticuladas; em segundo lugar, por considerarmos que o sub-desenvolvimento é um processo dinâmico e não estático, valendo dizer que se não for cerceando em sua irradiação, os seus efeitos acumulativos terminarão por criar aquele círculo vicioso da pobreza no qual o empobrecimento é ao mesmo tempo  causa e efeito; e, em terceiro lugar, por considerarmos que o desenvolvimento econômico não é um fato espontâneo, isto é, resulta da vontade de rompermos os grilhões que nos aferram ao pauperismo ou à simples estagnação.         

O claro entendimento desses pressupostos implica na consciência de que a ação pelo desenvolvimento reclama a existência de instrumentos institucionais adequados aos fins propostos. Esses instrumentos são os órgãos técnicos de planejamento e as agências de investimentos.      

Aos primeiros cabe desde o levantamento das necessidades e dos recursos materiais, ao levantamento das aspirações humanas das comunidades, onde vão atuar. E isto porque o desenvolvimento não é senão uma técnica que permite alcançar com rapidez, racionalidade e eficiência a elevação dos níveis de vida e a valorização social da própria criatura humana.          

Cabe ainda ao Conselho facilitar o entrosamento entre o planejamento regional, o estadual e o planejamento nacional, visando o desenvolvimento homogêneo, equilibrado e estável de todo o país.     

Às agências de investimentos cabe o financiamento de tais projetos, orientados todos no sentido de criação de riquezas, e não apenas de incrementá-las onde, de alguma forma, elas possam existir. Este fato é o único que faz que um banco de investimento seja também uma instituição a serviço do progresso social, serviço no qual se entregue certo de que o seu maior lucro está sempre na prosperidade e no bem estar que conseguir criar para as comunidades onde atua.        

O Banco Regional de Desenvolvimento Econômico do Extremo Sul nasce, Sr. Presidente, sob os signos mais promissores, que se exprimem no seu capital inicial, modesto é verdade, de 120 milhões de cruzeiros, e na maneira pela qual criará seus recursos. Estes procederão da contribuição anual de 1% da receita tributária dos Estados membros, a qual em primeiro exercício, já em 62, deverá atingir a cerca de 500 milhões de cruzeiros. Outra parte será formada por 10% da parte brasileira dos recursos gerados por todos os acordos para importação dos excedentes norte-americanos de trigo. No correr do presente exercício essa contribuição alcançará a quantia em torno de um bilhão de cruzeiros.       

O Banco será um instrumento captação de recursos e exercerá ainda a importante missão de retentor da poupança regional até hoje desviada para financiar empreendimentos em outras áreas.       

Com a criação do BRDE a nossa região estará igualmente em condições de levar a bom termo negociações com agências internacionais de investimento, fato de iniludível e decisivo alcance para a consecução dos nossos objetivos e planos de desenvolvimento.        

Toda a política de transformação estrutural de nossa economia passa a dispor, de agora por diante, dos instrumentos mais adequados e mais idôneos. Através deles, todas as nossas aspirações ganharão corpo, com a evidência dos resultados seguros, porque não mais sujeitos à improvisação e ao empirismo. Podemos agora realizar uma política que vise tanto a vitalização da ordem econômica quanto a execução correlata de uma política social que subordine e coloque a riqueza material a serviço exclusivo da dignidade da vida humana. A correção dos desequilíbrios que tão gritantemente afetam a nossa economia como também depende de nossa capacidade de modificarmos a nossa estrutura sócio-econômica. Para tanto o equipamento necessário consiste nos órgãos técnicos de planejamento e nos bancos de fomento.      

Criá-los importa em suscitar novos centros dinâmicos, novos pólos de crescimento econômico, estendendo sobre todo o território nacional uma rede de núcleos propulsores de progresso. Progresso que deve ser homogeneamente distribuído por todas as regiões, para  que o Brasil não continue sendo uma nação desarticulada que hoje se converteu.     

Senhor Presidente da República:       

Para nós governos, classes produtoras e populações do Extremo Sul é de grata significação e de excepcional importância, que a instalação dos dois órgãos básicos do progresso do Brasil Meridional seja nesse momento patrocinada por um ilustre filho desta região, identificado com os seus problemas e as suas aspirações.    

Estamos certos, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, cujas economias complementam, pela sua própria natureza subtropical, a economia brasileira, que todo o incremento dado à nossa riqueza será impulso oferecido ao próprio progresso do Brasil, que desejamos não apenas política, mas também econômica e socialmente unificado, numa obra de desenvolvimento que distribua os seus benefícios materiais e espirituais por todo o povo brasileiro, em vez de convertê-lo em privilégio de grupos e castas econômicas.

(Palmas)

 

22 de dezembro de 1961.